O
desporto, em particular o de alto rendimento, tem sido alvo de vários estudos
nas mais diversas áreas, com o objectivo de melhorar o desempenho dos atletas. A
curiosidade tipicamente humana na busca do saber ou por vezes até os interesses
económico-financeiros subjacentes levam a que se invista em formas de melhorar
a prestação desportiva dos atletas.
Actualmente,
é imperativo para o treino de qualquer modalidade desportiva colectiva, possuir
técnicos que dominem uma panóplia de conteúdos e ciências ou então recrutar
pessoas com diferentes valências para as estruturas, equipa técnicas e/ou clube.
A
tomada de decisão tem sido um dos temas alvo de estudo e de reconhecida
importância como instrumento potenciador do rendimento dos praticantes das mais
diversas modalidades desportivas.
O
futebol, pelo elevado número de elementos por equipa, oferece mais opções de
decisão que modalidades desportivas colectivas menos numerosas. Como jogo
dinâmico que é, sempre em constante mudança durante todo o tempo que dura a
partida, os seus participantes deparam-se constantemente com situações que
foram previstas mas também muitas imprevistas às quais tem que dar resposta
imediata. Posto isto, parece-me que faz todo o sentido investir num treino que
ajude a melhorar as decisões tomadas pelos jogadores.
A
qualidade da resposta perante a situação com que um jogador se depara, assim
como a rapidez com que o faz, depende do conhecimento que este detém do jogo,
sendo que este conhecimento advém do número de anos de prática que cada jogador
tem.
Dentro
do jogo de futebol existem varias formas de o jogar (aquilo a que, normalmente,
se chama de modelo de jogo), sendo que o rendimento do jogador será tanto maior
quanto melhor for o conjunto de boas decisões que este tome durante uma partida.
As decisões serão de melhor qualidade quanto maior for o conhecimento que o
jogador tiver sobre a forma de jogar da sua equipa, ou seja, quanto maior for o
seu conhecimento do modelo de jogo.
Uma
partida de futebol, é uma batalha constante entre duas equipas que procuram
concertar esforços para manter a sua organização, ao mesmo tempo que procuram
destabilizar a equipa adversária, quer por acções colectivas quer por acções
individuais no sentido de conseguir criar situações potenciadoras de
finalização e consequentemente ganhar a partida.
O
objectivo do treino deve, assim, visar também o melhoramento da capacidade de
tomada de decisão dos jogadores. Como vimos anteriormente, o conhecimento da
forma de jogar da equipa ajuda o jogador a tomar melhores decisões, mas também
ajudará ter um bom conhecimento quer da forma de jogar dos seus companheiros de
equipa, quer dos elementos da equipa adversária.
Quando
um jogador tem de fazer um passe para um colega de equipa, deve considerar
múltiplos factores: se joga no pé ou no espaço, se optar pelo espaço deve ter a
perfeita noção de a que distância deve colocar a bola do colega para quem é
dirigido o passe, pois se for muito para a frente, este pode não ser rápido o
suficiente para receber e ficar na posse da bola.
As
situações de um contra um são frequentes durante o jogo e, mais uma vez, o
jogador portador da bola deve perceber qual a acção a tomar: se enfrentar o
adversário e ariscar perder a bola durante o confronto ou optar por garantir a
posse de bola e fazer um passe a um colega que dê mais garantias de a manter.
Se optar por enfrentar o adversário existe informação que este consegue
recolher no momento para o ajudar a decidir melhor, como por exemplo: ver o
posicionamento e orientação dos pés, se o adversário estiver orientado para a
esquerda, fazer a finta para o lado contrário pode dar alguns milésimos de
segundos de vantagem, suficientes para que a acção possa ser bem-sucedida.
Informações como pé dominante e velocidade do seu opositor podem ser também
importantes na decisão que o jogador possa tomar.
Por
vezes um jogador está perante uma situação em que sabe perfeitamente o que
fazer para que seja bem-sucedido, porém a sua má condição física ou cansado não
lhe dariam boas hipóteses de que obtivesse sucesso, este conhecimento do seu
estado físico vai permitir-lhe optar por uma acção diferente, correndo menos
riscos.
Pode-se
afirmar que a tomada de decisão e o jogo de futebol têm uma relação umbilical e
indissociável. Esta relação deve ser potenciada através de processos do treino.
As tarefas de treino propostas devem ser ecológicas, ou seja, deve existir uma
estreita relação entre as tarefas propostas pelo treinador e o jogo/competição.
Os
melhores níveis de desempenho no futebol são alcançados pelos jogadores
peritos, que são aqueles que têm mais tempo de prática da modalidade e em que
muitas vezes conseguem antecipar uma determinada acção em vez de esperarem e
reagirem à mesma, isto dá-lhes vantagem perante os menos peritos que
normalmente são também mais novos.
Treinar
sob formas jogadas e reduzidas pode ser uma boa alternativa metodológica para
potenciar o aparecimento de jogadores peritos, pois pelo facto de estarem a
treinar desta forma vai obrigar a que os jogadores sejam sujeitos a tomar
decisões semelhantes às que se deparam durante uma partida de futebol e com
muita mais frequência, devido às pequenas dimensões da área de jogo e menor
número de intervenientes. Assim, pela prática contextualizada vamos criar
condições para que os jogadores atinjam melhores e mais rápidos níveis de expertise e de desempenho ao nível da
tomada de decisões, do que o fariam com treinos menos específicos e,
consequentemente, mais pobres ao nível da tomada de decisão.
Para
Duarte Araújo, a não contextualização
das tarefas/exercícios, vai criar dificuldades nos jogadores em saber o que e
como fazer, jogando aquém das suas possibilidades. Este mesmo autor refere que
a prática deve ser holística, mantendo a ligação entre as fontes de informação
relevante e as acções dos jogadores.
Por fim, os treinadores devem propor tarefas,
onde os jogadores aprendam como encontrar o seu próprio comportamento
adaptativo, de forma a antecipar e a resolver os problemas com que se deparam
no jogo.