terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Modelação Táctica ou Sistematização?


O futebol, como qualquer modalidade desportiva colectiva, na sua manifestação apresenta padrões comuns que são próprios da modalidade, mas também pode apresentar padrões de jogo individuais e únicos.

Os padrões de jogo individuais de cada equipa dizem respeito ao tipo de treino a que esta é sujeita, treino este que, em princípio, reflectirá a imagem do seu treinador e as ideias de jogo que possui.

O padrão de jogo que cada equipa apresenta pode ser adquirido através da sistematização (repetição) de conteúdos de treino ou da modelação táctica.

A sistematização, como já escrevi num artigo anterior, perde consistência quanto mais elevado for o nível em que as equipas competem pois o recurso a meios de observação quer por vídeo quer no local, assim como o adequado tratamento da mesma informação com recurso a programas informáticos oferecem-nos a possibilidade de dissecar, ao máximo, os padrões de jogo da equipa que vamos enfrentar, podendo mesmo antecipar as suas acções.

A modelação táctica, é um conceito que como o próprio nome indica visa modelar. O objectivo é, então, modelar princípios que sirvam de guias ou orientações para os jogadores procurarem soluções em respeito por esses mesmos princípios. A modelação táctica é por isso importante para que a equipa possa exprimir determinados comportamentos ou tendências que vão de encontro ao que o treinador quer ver materializado durante os vários momentos do jogo.

O conceito de modelação faz sentido nos princípios, pois não se podem modelar os fins, modelamos os princípios e aos fins pode-se chegar de várias formas.

Para Júlio Garganta, treinar é modelar, sendo esta uma questão central, pois é o treino que faz o jogo que por sua vez justifica o treino.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

A Tomada de Decisão em Futebol



O desporto, em particular o de alto rendimento, tem sido alvo de vários estudos nas mais diversas áreas, com o objectivo de melhorar o desempenho dos atletas. A curiosidade tipicamente humana na busca do saber ou por vezes até os interesses económico-financeiros subjacentes levam a que se invista em formas de melhorar a prestação desportiva dos atletas.

Actualmente, é imperativo para o treino de qualquer modalidade desportiva colectiva, possuir técnicos que dominem uma panóplia de conteúdos e ciências ou então recrutar pessoas com diferentes valências para as estruturas, equipa técnicas e/ou clube.

A tomada de decisão tem sido um dos temas alvo de estudo e de reconhecida importância como instrumento potenciador do rendimento dos praticantes das mais diversas modalidades desportivas.

O futebol, pelo elevado número de elementos por equipa, oferece mais opções de decisão que modalidades desportivas colectivas menos numerosas. Como jogo dinâmico que é, sempre em constante mudança durante todo o tempo que dura a partida, os seus participantes deparam-se constantemente com situações que foram previstas mas também muitas imprevistas às quais tem que dar resposta imediata. Posto isto, parece-me que faz todo o sentido investir num treino que ajude a melhorar as decisões tomadas pelos jogadores.

A qualidade da resposta perante a situação com que um jogador se depara, assim como a rapidez com que o faz, depende do conhecimento que este detém do jogo, sendo que este conhecimento advém do número de anos de prática que cada jogador tem.

Dentro do jogo de futebol existem varias formas de o jogar (aquilo a que, normalmente, se chama de modelo de jogo), sendo que o rendimento do jogador será tanto maior quanto melhor for o conjunto de boas decisões que este tome durante uma partida. As decisões serão de melhor qualidade quanto maior for o conhecimento que o jogador tiver sobre a forma de jogar da sua equipa, ou seja, quanto maior for o seu conhecimento do modelo de jogo.

Uma partida de futebol, é uma batalha constante entre duas equipas que procuram concertar esforços para manter a sua organização, ao mesmo tempo que procuram destabilizar a equipa adversária, quer por acções colectivas quer por acções individuais no sentido de conseguir criar situações potenciadoras de finalização e consequentemente ganhar a partida.

O objectivo do treino deve, assim, visar também o melhoramento da capacidade de tomada de decisão dos jogadores. Como vimos anteriormente, o conhecimento da forma de jogar da equipa ajuda o jogador a tomar melhores decisões, mas também ajudará ter um bom conhecimento quer da forma de jogar dos seus companheiros de equipa, quer dos elementos da equipa adversária.

Quando um jogador tem de fazer um passe para um colega de equipa, deve considerar múltiplos factores: se joga no pé ou no espaço, se optar pelo espaço deve ter a perfeita noção de a que distância deve colocar a bola do colega para quem é dirigido o passe, pois se for muito para a frente, este pode não ser rápido o suficiente para receber e ficar na posse da bola.

As situações de um contra um são frequentes durante o jogo e, mais uma vez, o jogador portador da bola deve perceber qual a acção a tomar: se enfrentar o adversário e ariscar perder a bola durante o confronto ou optar por garantir a posse de bola e fazer um passe a um colega que dê mais garantias de a manter. Se optar por enfrentar o adversário existe informação que este consegue recolher no momento para o ajudar a decidir melhor, como por exemplo: ver o posicionamento e orientação dos pés, se o adversário estiver orientado para a esquerda, fazer a finta para o lado contrário pode dar alguns milésimos de segundos de vantagem, suficientes para que a acção possa ser bem-sucedida. Informações como pé dominante e velocidade do seu opositor podem ser também importantes na decisão que o jogador possa tomar.

Por vezes um jogador está perante uma situação em que sabe perfeitamente o que fazer para que seja bem-sucedido, porém a sua má condição física ou cansado não lhe dariam boas hipóteses de que obtivesse sucesso, este conhecimento do seu estado físico vai permitir-lhe optar por uma acção diferente, correndo menos riscos.

Pode-se afirmar que a tomada de decisão e o jogo de futebol têm uma relação umbilical e indissociável. Esta relação deve ser potenciada através de processos do treino. As tarefas de treino propostas devem ser ecológicas, ou seja, deve existir uma estreita relação entre as tarefas propostas pelo treinador e o jogo/competição.

Os melhores níveis de desempenho no futebol são alcançados pelos jogadores peritos, que são aqueles que têm mais tempo de prática da modalidade e em que muitas vezes conseguem antecipar uma determinada acção em vez de esperarem e reagirem à mesma, isto dá-lhes vantagem perante os menos peritos que normalmente são também mais novos.

Treinar sob formas jogadas e reduzidas pode ser uma boa alternativa metodológica para potenciar o aparecimento de jogadores peritos, pois pelo facto de estarem a treinar desta forma vai obrigar a que os jogadores sejam sujeitos a tomar decisões semelhantes às que se deparam durante uma partida de futebol e com muita mais frequência, devido às pequenas dimensões da área de jogo e menor número de intervenientes. Assim, pela prática contextualizada vamos criar condições para que os jogadores atinjam melhores e mais rápidos níveis de expertise e de desempenho ao nível da tomada de decisões, do que o fariam com treinos menos específicos e, consequentemente, mais pobres ao nível da tomada de decisão.

Para Duarte Araújo, a não contextualização das tarefas/exercícios, vai criar dificuldades nos jogadores em saber o que e como fazer, jogando aquém das suas possibilidades. Este mesmo autor refere que a prática deve ser holística, mantendo a ligação entre as fontes de informação relevante e as acções dos jogadores.

 Por fim, os treinadores devem propor tarefas, onde os jogadores aprendam como encontrar o seu próprio comportamento adaptativo, de forma a antecipar e a resolver os problemas com que se deparam no jogo.